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quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

A transitoriedade - Sigmund Freud (trecho)

"Valor de transitoriedade é valor de raridade no tempo. A limitação da possibilidade da fruição aumenta a sua preciosidade. É incompreensível (...) que a idéia da transitoriedade do belo deva perturbar a alegria que ele nos proporciona.
(...) Talvez chegue o dia em que os quadros e estátuas que hoje admiramos se reduzam a pó, ou que nos suceda uma raça de homens que não mais entenda as obras de nossos poetas e pensadores, ou que sobrevenha uma era geológica em que os seres vivos deixem de existir sobre a Terra; mas se o valor de tudo quanto é belo e perfeito é determinado somente por seu significado para a nossa vida emocional, não precisa sobreviver a ela, e portanto independe da duração absoluta".
(Sigmund Freud. A transitoriedade. In: Obras completas. Companhia das Letras, São Paulo: 2010 [1914-16], v.12, p.249).

Considerações atuais sobre a guerra e a morte - Sigmund Freud (trechos)

 
"A civilização foi adquirida pela renúncia à satisfação instintual, e exige de cada "recém-chegado" essa mesma renúncia. Durante a vida individual há uma contínua transformação de coação externa em coação interna. As influências culturais levam a que tendências egoístas cada vez mais se convertam em altruístas, sociais, pela adjunção de elementos eróticos. Enfim, é lícito supor que toda coação interna que se faz notar no desenvolvimento do ser humano era originalmente, ou seja, na história da humanidade, apenas coação externa" - (p.220-1). 
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"O ser individual se encontra não apenas sob o influxo do seu meio cultural presente, mas está sujeito também à influência da história cultural de seus antepassados" - ( p.221).
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"Quem é obrigado a reagir continuamente segundo preceitos que não são expressão de seus pendores instintuais vive acima de seus meios, psicologicamente falando, e pode objetivamente ser designado como um hipócrita, esteja ele consciente ou não dessadiscrepância. É inegável que nossa atual civilização favorece de maneira extraordinária a produção de tal espécie de hipocrisia. Podemos ousar afirmar que ela está edificada sobre essa hipocrisia, e que teria que admitir profundas mudanças, caso as pessoas se propusessem viver conforme a verdade psicológica. Portanto, existem muito mais hipócritas culturais do que homens realmente civilizados, podendo-se mesmo considerar o ponto de vista de que um certo grau de hipocrisia cultural seja indispensável para a manutenção da cultura, porque a aptidão cultural já estabelecida nos homens de hoje talvez não bastasse para essa realização. Por outro lado, a manutenção da cultura, ainda que sobre uma base tão duvidosa, oferece a perspectiva de preparar o caminho, em cada nova geração, para uma transformação instintual mais ampla, portadora de uma cultura melhor" - (p.223-4).
"Argumentos lógicos são impotentes em face de interesses afetivos" - (p.228).
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"Uma proibição tão forte pode se dirigir apenas a um impulso igualmente forte. O que nenhuma alma humana cobiça não é necessário proibir, exclui-se por si mesmo" - ( p.241).
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"Não seria melhor dar à morte o lugar que lhe cabe, na realidade e em nossos ´pensamentos, e pôr um pouco mais à mostra nossa atitude inconsciente ante a morte, que até agora reprimimos cuidadosamente? Isso não parece uma realização maior, seria antes um passo atrás em vários aspectos, uma regressão, mas tem a vantagem de levar mais em conta a verdade e nos tornar a vida novamente suportável. Suportar a vida continua a ser o primeiro dever dos vivos. A ilusão perde o valor se nos atrapalha nisso.
Recordemo-nos do velho ditado: Si vis pacem, para bellum. Se queres conservar a paz, prepara-te para a guerra.
No momento atual caberia mudá-lo: Si vis vitam, para mortem. Se queres aguentar a vida, prepara-te para a morte" - (p. 246).

Sobre o amor - Saramago

Penso saber que o amor não tem nada que ver com a idade, como acontece com qualquer outro sentimento. Quando se fala de uma época a que se chamaria de descoberta do amor, eu penso que essa é uma maneira redutora de ver as relações entre as pessoas vivas. O que acontece é que há toda uma história nem sempre feliz do amor que faz que seja entendido que o amor numa certa idade seja natural, e que noutra idade extrema poderia ser ridículo. Isso é uma ideia que ofende a disponibilidade de entrega de uma pessoa a outra, que é em que consiste o amor.
Eu não digo isto por ter a minha idade e a relação de amor que vivo. Aprendi que o sentimento do amor não é mais nem menos forte conforme as idades, o amor é uma possibilidade de uma vida inteira, e se acontece, há que recebê-lo. Normalmente, quem tem ideias que não vão neste sentido, e que tendem a menosprezar o amor como factor de realização total e pessoal, são aqueles que não tiveram o privilégio de vivê-lo, aqueles a quem não aconteceu esse mistério.