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domingo, 28 de janeiro de 2018

A diferença invisível - Mademoiselle Caroline & Julie Dachez


"Você que é um dedo do meio à imposição da "normalidade".
Não há nada a curar em vocês, nada a mudar. Seu papel não é se encaixar em um molde, mas sim ajudar os outros - todos os outros - a sair dos moldes em que estão presos. Você não está aqui para seguir um caminho predefinido, mas, ao contrário, para seguir o seu próprio caminho e convidar aqueles ao seu redor a pensar fora da caixa.
Ao abraçar sua verdadeira identidade, aceitando sua singularidade, você se torna um exemplo a ser seguido. Você tem o poder de romper essa camisa de força normativa que sufoca a todos nós e nos impede de viver juntos com respeito e tolerância.
Sua diferença não é parte do problema, mas da solução.
É um remédio para a nossa sociedade, doente de normalidade".

(HQ - trecho da dedicatória - São Paulo: Nemo, 2017).


Vídeo sobre a HQ: 



terça-feira, 10 de novembro de 2015

Nana faz Filosofia sem saber - diálogo de "Vivre sa vie" - Godard - 1962


- É engraçado. De repente não sei o que dizer; isso acontece muito comigo. Eu sei o que quero dizer. Eu reflito sobre o que quero dizer. Mas no momento de dizer, eu não consigo.
- Sim, claro. Você leu "Os três mosqueteiros?"
- Não. Eu vi o filme. Por quê?
- Porque nele, Porthos (...) o grande, o forte, um pouco besta, ele nunca pensou em sua vida, compreende? Então uma vez ele tem de impantar uma bomba numa adega, para explodí-la. Ele o faz. Ele coloca a bomba, acende-a, e sai correndo, naturalmente. Mas de golpe, ele começa a pensar. Ele pensa no que? Ele se pergunta como ele pode colocar um pé após o outro...você já deve ter pensado sobre isso também...E então ele pára de correr. Ele não pode mais, não pode avançar. Tudo explode, a adega cai sobre ele. Ele a segura em seus ombros, ele é forte. Mas depois de um dia, ou dois, ele cede, e morre. A primeira vez que pensa ele morre.
- Por quê me conta essa história?
- Sem razão, só por falar.
- E por quê a gente precisa sempre falar? Muitas vezes devíamos nos calar, viver em silêncio. Quanto mais fala-se, menos as palavras significam.
- Talvez, mas como se pode?
- Eu não sei.
- Eu acho que não podemos viver sem falar.
- Então é isso, eu gostaria de viver sem falar.
- Sim, isso seria bom, não? É como se não amássemos mais. Mas não é possível, nunca vai ser .
- Mas por quê? As palavras deviam exprimir exatamente o que queremos dizer. Elas nos traem?
- Mas nós as traímos também. Nós devíamos poder dizer o que queremos como já foi feito com a boa escrita. É mesmo extraordinário que um homem como Platão - a gente pode ainda compreender - a gente compreende. Ainda sim ele escreve em greg, há 2500 anos, Ninguém sabe realmente a lígnau daquela época, ao menos exatamente. Mas ainda sim passa alguma coisa, então nós devemos poder nos expressar. E nós precisamos.
- E por quê devemos nos exprimir? Para se compreender?
- Nós precisamos pensar, e para pensar, é preciso falar, Não há outro jeito de pensar. E para comunicar, deve-se falar; é a vida.
- Sim, mas ao mesmo tempo é muito difícil. Eu acho que a vida devia ser fácil. Você sabe, a história dos três mosqueteiros pode ser muito boa mas é terrível.
- Sim, mas é uma indicação. Eu acredito que aprendemos a falar bem quando renunciamos à vida por algum tempo. É quase...o preço...
- Então falar é mortal?
- Falar é quase uma ressureição em relação à vida. Quando falamos é uma outra vida de quando não falamos. Então, para viver falando deve-se passar pela morte da vida sem falar. Eu talvez não esteja sendo claro, mas há uma certa regra ascética que te impede de falar bem até olharmos a vida com desapego.
- Mas não se pode viver a vida com...Eu não sei...
- com desapego...Sim, mas nós balanceamos, é por isso que devemos passar do silêncio às palavras. Nós balançamos entre os dois porque é o movimento da vida. Da vida cotidiana nós nos elevamos a uma vida que chamamos de superior ...é a vida do pensamento ...mas essa vida pressupõe a morte da vida cotidiana ... a vida demais elementar...
- Mas então pensar e falar se parecem?
- Eu acredito. Platão o disse; é uma ideia antiga. Nós não podemos distinguir do pensamento o que é o pensamento e as palavras que o exprimem. Analisando a consciência, você não consegue separar o momento de pensar das palavras.
- Falando, então, a gente arrisca mentir?
- Sim, porque as mentiras são também parteda nossa busca. Há pouca diferença entre erro e mentira. Não quero dizer as mentiras comuns como "prometo ir amanhã, mas não vou porque não queria". Entende, esses são truques. Mas uma mentira sutil é um pouco distante de um erro. A gente procura, e não consegue achar as palavras certas. É por isso que você não conseguia saber o que ía dizer. Você tinha medo de não achar a palavra certa. E eu acho que é isso.
- Sim, mas como ter certeza de ter encontrado a palavra certa?
- Deve-se trabalhar. É necessário um esforço. Deve-se falar de um modo que é certo, não machuque, diga o que há para ser dito, faça o que tem de fazer, sem machucar, nem ferir ...
- Sim, um deve tentar ser de boa fé . Uma vez alguém me disse "a verdade está em tudo, mesmo no erro".
- Isso é verdade.Isso não foi visto na França do século XVII. Eles achavam que podiam evitar o erro, e ainda mais que isso, que podia-se viver na verdade diretamente. Creio que não seja possível. Por isso há Kant, Hegel, a filosofia alemã: para nos conduzir à vida e nos fazer ver que devemos passar pelo erro para chegar na verdade.
- O que você pensa do amor?
- O corpo tinha de chegar nisto. Leibnitz introduziu o contingente. Verdades contigentes e verdades necessárias fazem a vida cotidiana. Aos poucos chegamos na filosofia alemã onde pensamos, na vida, com os erros da vida, com as servitudes da vida. E deve-se lidar com isso, é verdade,
- O amor não deveria ser a única verdade?
- Mas para isso, o amor deveria ser sempre verdadeiro. Você conhece alguém que sabe de cara quem ele ama? Não é verdade. quando você tem vinte anos não sabe o que ama. Você sabe migalhas, se agarra só a sua experiência. Você diz "eu amo isso", é sempre uma mistura. Mas para ser constituído inteiramente daquilo que se ama, é preciso a maturidade. Isso significa buscar. E é essa a verdade da vida. É por isso que o amor é uma solução, na condição que seja verdadeiro....   

Trailer do filme:









segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Antes que anoiteça - Reinaldo Arenas

 
Antes que, tal como naquele período negro da História, o divergente tenha suas palavras sufocadas por uma estratégia silenciadora do particular, estratégia desejante que haja uma massa sem qualquer saliência que seja mais fácil de afagar ou lançar pra longe. Antes que uma estratégia dolorosamente totalizante se aproprie do mais estranho em nós mesmos, daquilo que carrega o germen da subversão. Antes que esta estratégia violentamente persecutória, movida por ideais quaisquer, sejam eles religiosos, políticos ou sociais, suplante o "ir e vir" ou a conquista da eletricidade, obrigando o sujeito a se embrenhar nas matas selvagens, donde só pode contar com a condescendência da luz solar para escrever o que lhe resta, seja razão ou loucura, antes que o negro torne a visão inoperante.
"Antes que anoiteça", leia a autobiografia de Reinaldo Arenas, que não bastando se sentir exilado de si mesmo, teve que se exilar de sua ilha natal por conta de uma sexualidade chamada de estrangeira pelo outro.
Se você não é socialista....leia. Se é, leia mais ainda. E antes de aceitar a advertência de qualquer um que lhe diga: "Não leia este traidor!" reflita se não é uma traição não estar sensível a angústia de um sujeito por conta da sua escuta estar atravessada por ideologias, traição que não é maior para com o outro do que é para você. Não perca de vista aquele famoso trecho que virou adágio da carta de Rimbaud.
 
*
 
Trechos de "Antes que anoiteça", de Reinaldo Arenas:
 
"Acredito que o esplendor da minha infância tenha sido único, pois se desenvolveu na mais absoluta miséria, mas também na mais absoluta liberdade; em campo aberto, cercado de árvores, bichos, aparições e pessoas que eram indiferentes em relação a mim. Minha existência não era sequer justificada, e ninguém se importava. Isso facilitava enormemente minhas fugas, sem que ninguém se preocupasse com o local do meu esconderijo ou com a hora da minha volta" (p.22).
*
"Acho que a época mais fértil da minha criação foi a infância; foi um mundo de criatividade. Para preencher aquela solidão tão profunda que eu experimentava em meio a tanto ruído, povoei todo o campo, aliás bastante raquítico, com personagens e aparições quase míticas e sobrenaturais. Uma das personagens que eu via com enorme clareza todas as noites era um velho que rolava um aro, debaixo a imensa mata que crescia em frente à casa. Quem era aquele velho? Por que ficava rolando aquele aro que parecia uma roda de bicicleta? Era o horror que me aguardava? O horror que aguardava toda a vida humana? Era a morte? A morte sempre esteve muito próxima de mim; tem sido uma companheira tão fiel que às vezes lamento ter que morrer, pois então talvez a morte me abandone" (pp.23-4).
*
"Sempre achei que minha família, incluindo minha mãe, considerava-me um ser estranho, meio doido ou louco; completamente fora do contexto de suas vidas. Com certeza, tinham toda razão" (p.36).
*
"O mar é nossa selva e nossa esperança" (p.341).
 
(In. Antes que anoiteça. Rio de Janeiro: Bestbolso, 2009).
 
Trecho do filme "Antes que anoiteça", estrelado por Javier Bardem, baseado na obra do escritor cubano:
 
*
 
 


segunda-feira, 10 de março de 2014

Hemingway & Gellhorn - o Filme (trecho).


"O homem pode ser estruído mas não derrotado. Se ainda está de pé, ele pode lutar".
*
"Escrever é como ir à missa. Deus se aborrece se você não aparecer".
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 "Martha...você tem que ficar comigo. A felicidade em pessoas inteligentes é a coisa mais rara que eu conheço".

Trailer do filme:


Sobre o filme:



segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Teorema - Pasolini ( trecho).

 "Não me reconheço mais.
O que me tornava igual aos outros foi destruído.
Eu era como os outros, talvez, com muitos defeitos... os meus e os do meu mundo.
Você me tirou da ordem natural das coisas.
E, enquanto você estava perto, eu não tinha percebido.
Agora entendo que você vai embora. E perder você me conscientizou da minha diferença.


O que será de mim?
O futuro será como viver perto de um outro "eu"  que não tem nada a ver comigo.
Devo chegar ao fundo dessa diferença que você me revelou e que é a minha íntima e equidistante natureza?
Mas, se não quero, tudo isso não vai me colocar contra tudo e contra todos?





Sobre o filme:
*


Trailer do filme:



segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Flores raras - filme (trecho)

"Elisabeth: - Eu não bebo porque as coisas vão mal. Eu quero beber a cada minuto de cada dia. As coisas indo mal são só desculpas para ficar bêbada.
Lota: - Mas por quê?
Elisabeth: - Porque quando eu não tenho o que quero eu me sinto sozinha e triste...e quando eu tenho o que quero tenho certeza que vou perder. E a espera é insuportável".

Trailer do filme:

Cena do filme:

Reportagem sobre o filme:

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Liberté et Patrie - Jean Luc Godard (trechos)


"Se aprende a palavra pensar, e sabe-se como usá-la, mas, dependendo das circunstâncias, não se pode descrevê-la".
*
"E tem de errar muitas vezes, para não voltar a errar...".
*
" - Pai, qual é o melhor modo de saber se alguém é digno de confiança?
- Pergunte: "O que você leu"? Se responder: " Homero, Shakespeare, Balzac", então não é digno de confiança. Mas se responder: "Depende do que você quer dizer com ler", então há esperança".

Link para o curta de Godard na íntegra e legendado no youtube:


quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Provocações com Daniela Arbex, autora do livro "Holocausto Brasileiro".

O programa "Provocações", com Antônio Abujamra, transmitiu  pela Tv Cultura na noite de 17/09/2013 a entrevista com Daniela Arbex, autora do livro "Holocausto Brasileiro".
O programa está disponível na íntegra no youtube, dividido em três partes:

Parte I:

Parte II:


Parte III:

*
"Sorôco, sua mãe, sua filha"

É  de Guimarães Rosa a expressão "trem de doido" incluída no conto "Sorôco, sua mãe, sua filha", do livro Primeiras Estórias. Ali o autor resume a situação dos trens que chegavam a Barbacena apinhados de gente "em busca de tratamento psiquiátrico". Ele conta a angústia do personagem Sorôco na despedida das únicas pessoas que tinha no mundo e que partiriam no trem da solidão coletiva. O importante escritor brasileiro, aliás, morou em Barbacena, em 1933, quando foi oficial médico do 9º Batalhão de Infantaria. O simbolismo da loucura em seus contos são indício de que Guimarães Rosa conhecia a realidade da Colônia. O psiquiatra Francisco Paes Barreto entra no mundo ficcional de Guimarães Rosa e consola Sorôco em carta endereçada ao personagem. "Meu querido Sorôco, esteja onde estiver, quero que ouça o que tenho a lhe dizer. Visitei hoje o lugar onde morreu sua mãe, onde morreu sua filha, onde morreram as mães, os pais, os filhos e os irmãos de um incontável número de pessoas. Sabe o que encontrei lá? Um Centro de Atenção Psicossocial (Caps). Um hospital regional de clínica médica e cirúrgica. Um centro social urbano. Uma escola. (...)Do que havia do antigo hospital resta apenas um edifício imponente, que é a principal atração turística da cidade. Chama-se Museu da Loucura. Está aí exatamente para não deixar esquecer, para registrar uma época. É um templo dedicado à loucura. Não à loucura de pessoas como sua mãe, sua filha, mas a nossa loucura, Sorôco, à loucura dos chamados normais."
Fonte: http://www.tribunademinas.com.br/cidade/a-historia-por-tras-da-historia-1.992847

*

terça-feira, 17 de setembro de 2013

Masculin, Feminin - Jean-Luc Godard (trechos)



" - Por que você quer sair comigo esta noite?
- Porque você é linda, e todos precisamos de ternura.
- Não há mais nada em mim que o atraia?
- Sim. Tudo".
*
Não se pode viver sem ternura. Seria mortal".
*
"É difícil dizer o que se quer se não se está acostumado".
*
"Se matar um homem, você é um assassino.
Se matar milhões, é um conquistador.
Se matar todos os homens, é Deus".

 


Link do youtube com o filme legendado:

terça-feira, 27 de agosto de 2013

Fahrenheit 451 - Ray Bradbury (trechos favoritos)


"O rosto de Clarisse, agora voltado para ele, era um frágil cristal leitoso dotado de uma luz suave e constante. Não era a luz histérica da eletricidade, mas... o quê? A luz estranhamente aconchegante e rara e levemente agradável de uma vela. Certa vez, quando criança, durante uma queda de energia, sua mãe havia encontrado e acendido uma última vela e houve um breve instante de redescoberta, de uma iluminação tal que o espaço perdera suas vastas dimensões e se fechara aconchegante em torno deles, mãe e filho, a sós, transformados, torcendo para que a energia não voltasse tão cedo..." - (p.27).
"Lançou de novo o olhar à parede. Como o rosto dela se parecia também com um espelho! Impossível. Pois quantas pessoas seriam capazes de refletir a luz de uma outra? As pessoas quase sempre eram - procurou uma comparação, encontrou-a em seu ofício - archotes, que ardiam até se extinguir. Quantas pessoas existiam cujos rostos eram capazes de captar e devolver a expressão da outra, seus pensamentos e receios mais íntimos?...Quantos minutos haviam caminhado juntos? Três minutos? Cinco?"- (p.31).
"Escuridão. Não estava feliz. Não estava feliz. Disse as palavras a si mesmo. Admitiu que este era o verdadeiro estado das coisas. Usava sua felicidade como uma máscara e a garota fugira com ela pelo gramado e não havia como ir bater à sua porta para pedi-la de volta" - (p. 32).
"Bem, afinal de contas, estamos na era do lenço descartável. Assoe seu nariz numa pessoa, encha-a, esvazie-a, procure outra, assoe, encha, esvazie. Cada um está usando as fraldas da camisa do outro. Como torcer para o time da casa quando não se tem nem um programa nem sabemos os nomes? Por falar nisso, que camisa estão usando quando entram em campo?" - (p.38).
"Você não é como os outros. Eu vi alguns; eu sei. Quando eu falo, você olha para mim. Ontem à noite, quando eu disse uma coisa sobre a lua, você olhou para a lua. Os outros nunca fariam isso. Os outros continuariam andando e me deixariam falando sozinha. Ou me ameaçariam. Ninguém tem mais tempo para ninguém. Você é um dos poucos que me toleram. É por isso que eu acho tão estranho você ser bombeiro. É que, de algum modo, não combina com você" - (p. 45).
"Quem dera pudessem ter levado sua mente para uma lavagem a seco, esvaziado seus bolsos, e a tivessem vaporizado, limpado e remontado e a devolvessem pela manhã. Quem dera..." - (p.37).
"-Por que você não está na escola? Todo dia eu a vejo vagando por aí.
- Ah, eles não sentem a minha falta - disse ela. - Dizem que sou antissocial. Não me misturo. É tão estranho. Na verdade, eu sou muito social. Tudo depende do que você entende por social, não é? Social para mim significa conversar com você sobre coisas como esta. - Ela chacoalhou algumas castanhas que haviam caído da árvore do jardim da frente. - Ou falar sobre como o mundo é estranho. É agradável estar com as pessoas. Mas não vejo o que há de social em juntar um grupo de pessoas e depois não deixá-las falar, você não acha? (...) nunca fazemos perguntas; pelo menos a maioria não faz; eles passam as respostas para você, pim, pim, pim, e nós, sentados ali, assistindo a mais quatro horas de filmes educativos. Isso para mim não é nada social. Parece um monte de funis e muita água jorrando da torneira, entrando por um lado e saindo pelo outro, e depois eles vêm nos dizer que é vinho, quando não é" - (p.52).
"Como uma pessoa fica tão vazia?, perguntou a si mesmo. Quem esvazia a gente?" - (p.68).
"- Me deixe em paz - disse Mildred. - Eu não fiz nada.
- Deixar você em paz! Tudo bem, mas como eu posso ficar em paz? Não precisamos que nos deixem em paz. Precisamos realmente ser incomodados de vez em quando. Quanto tempo faz que você não é realmente incomodada? Por alguma coisa importante, por alguma coisa real?" - (p.76).
"Se não quiser um homem politicamente infeliz, não lhe dê os dois lados de uma questão para resolver; dê-lhe apenas um. Melhor ainda, não lhe dê nenhum. Deixe que ele se esqueça de que há uma coisa como a guerra (...). Encha as pessoas com dados incombustíveis, entupa-as tanto com os "fatos" que elas se sintam empanzinadas, mas absolutamente "brilhantes" quanto a informações. Assim, elas imaginarão que estão pensando, terão uma sensação de movimento sem sair do lugar. E ficarão felizes, porque fatos dessa ordem não mudam. Não as coloque em terreno movediço, como filosofia ou sociologia, com que comparar suas experiências. Aí reside a melancolia. Todo homem capaz de desmontar um telão de tevê e montá-lo novamente, e a maioria consegue, hoje em dia está mais feliz do que qualquer homem que tenta usar a régua de cálculo, medir e comparar o universo, que simplesmente não será medido ou comparado sem que o homem se sinta bestial e solitário. Eu sei porque já tentei. Para o inferno com isso! Portanto, que venham seus clubes e festas, seus acrobatas e mágicos, seus heróis, carros a jato, motogiroplanos, seu sexo e heroína, tudo o que tenha a ver com o reflexo condicionado. Se a peça for ruim, se o filme não disser nada, estimulem-me com o temerim, com muito barulho. Pensarei que estou reagindo à peça, quando se trata apenas de uma reação tátil à vibração. Mas não me importo. Tudo o que peço é um passatempo sólido" - (p.86-7).
"Ninguém mais presta atenção. Não posso falar com as paredes, porque elas estão gritando para mim. Não posso falar com a minha mulher; ela escuta as paredes. Eu só quero alguém para ouvir o que tenho a dizer. E talvez, se eu falar por tempo suficiente, minhas palavras façam sentido" - (p.109).
"Eu me agarrei firme ao mundo algum dia. Já pus um dedo nele; é um começo" - (p.197).
 
(In. Fahrenheit 451. Ray Bradbury. São Paulo: Globo, 2012).
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Sobre o livro:
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O filme de Truffaut no youtube:
 


quarta-feira, 24 de julho de 2013

Documentário: Imagens do inconsciente, "Em busca do espaço cotidiano" - Fernando Diniz


Nise da Silveira - Do mundo da Caralâmpia à emoção de lidar


Entrevista com a Dra. Nise da Silveira, realizada em 03 e 04 de agosto 1992 por Gonzaga Leal e Rubem Rocha Filho. Nesta entrevista, Nise fala das suas inquietações, das suas filiações teóricas e de sua experiência na relação com a loucura, com o desassossego, com a dor humana e com a instituição psiquiátrica. Se remete a Antonin Artaud e Jung como mestres decisivos na formulação do seu campo conceitual teórico-prático no manejo da clínica da psicose. Interroga a psiquiatria clássica ao mesmo tempo em que aponta a sua aliança com a anti-psiquiatria e com artistas pertencentes as mais diversas linguagens. Atrevida que era, utilizou o animal como co-terapeutas, desafiando o status quo da tradição psiquiátrica, o que veio fortalecer um dos seus conceitos de maior força e potência por ela desenvolvidos, O AFETO CATALIZADOR. Durante todo o percurso da entrevista Nise deixa claro o seu sonho desde pequena -- apaziguar o sofrimento humano. Conciliando ternura, firmeza de convicções, sensibilidade e rigor teórico, Nise esteve a frente do seu tempo, sendo responsável pela idealização e criação de dois espaços de clínica e de pesquisa de maior referência mundial, o MUSEU DE IMAGENS DO INCONSCIENTE, e a CASA DAS PALMEIRAS, instituição para pacientes egressos de clínicas psiquiátricas antecipando-se em mais de 30 anos ao que hoje modernamente chama-se CAPS -- CENTROS DE ATENÇÃO PSICO-SOCIAL.

Parte I:

Parte II:

Parte III:

segunda-feira, 22 de julho de 2013

Holocausto brasileiro - Daniela Arbex (trecho)

"Antônio Gomes da Silva, sessenta e oito anos, foi um dos pacientes encaminhados para o hospital, aos vinte e cinco anos. Há poucos registros sobre o passado de Cabo, como Antônio foi apelidado. O que se conta sobre ele é que o desemprego se somou à bebedeira em sua prisão. Hoje, passados mais de quarenta anos do episódio, o Cabo não sabe mais o motivo pelo qual foi mandado para o Colônia pela caneta de um delegado no dia 3 de janeiro de 1969.
- Não sei por que me prenderam. Cada um fala uma coisa. Mas, depois que perdi meu emprego, tudo se descontrolou. Da cadeia, me mandaram para o hospital, onde eu ficava pelado, embora houvesse muita roupa na lavanderia. Vinha tudo num caminhão, mas acho que eles queriam economizar. No começo, incomodava ficar nu, mas com o tempo a gente se acostumava. Se existe inferno, o Colônia era esse lugar.
Antônio fala baixo, quase como se não quisesse lembrar. Tem o rosto apoiado às mãos, e, apesar da estatura alta, parece querer esconder-se de si mesmo. Dentro da unidade, manteve-se calado durante vinte e um dos trinta e quatro anos em que ficou internado. Considerado mudo, soltou a voz, um dia, ao ouvir a banda de música do 9 Batalhão da Polícia Militar.
- Por que você não me disse que falava? - perguntou um funcionário da unidade, surpreso com a novidade.
- Uai, ninguém nunca perguntou.
Cabo também passou a vida assinando documentos com as digitais. Até descobrirem que ele sabia escrever o próprio nome. Deixou o hospital em 2003, para morar numa residência terapêutica de Barbacena, uma das vinte e oito casas mantidas pela prefeitura da cidade em parceria com a ONG Instituto Bom Pastor.
Quando se viu fora dos muros do hospital, não sabia como sobreviver sem amarras.
- A que horas as luzes se apagam aqui? - perguntou na primeira noite liberto do cativeiro.
Retirado do convíviio social por quase meio século, ele jamais poderia imaginar que agora era o dono do seu tempo e que tinha ele mesmo o poder de clarear ou escurecer o ambiente com um simples toque do interruptor. Além de nunca ter visto um apagador de luz, ser dono de si era uma novidade para quem viveu décadas de instituicionalização. Para Antônio, no entanto, se desvenciliar do Colônia foi tão difícil quanto mudar de endereço. O hospital estava ali, marcado não só em seu corpo, mas também impregnado na sua alma. Por isso, os pesadelos tornavam seu sono sobressaltado e se repetiam noite após noite. Acordava com o suor umedecendo o pijama e sempre com a mesma sensação de terror. Olhava ao redor para ver onde estava e descobria que os eletrochoques com os quais sonhava ainda o mantinham prisioneiro do Colônia.
Recordava-se sempre do início das sessões, quando era segurado pelas mãos e pelos pés para que fosse amarrado ao leito. Os gritos de medo eram calados pela borracha colocada à força entre os lábios, única maneira de garantir que não tivesse a língua cirtada durante as descargas elétricas. O que acontecia após o choque Cabo não sabia. Perdia a consciência, quando o castigo lhe era aplicado".
(In. Holocausto brasileiro.Daniela Arbex. São Paulo: Geração Editorial, 2013, p.30-35).
*
Booktrailer do livro:
*
"Em nome da razão", documentário de Helvécio  Ratton sobre o "Colônia":

sábado, 1 de junho de 2013

Eu a amava - Anna Gavalda (trechos favoritos)

 
"Quanto tempo é preciso para esquecer o cheiro de quem nos amou? E quando a gente deixa de amar? Que me dêem uma ampulheta" - (P.28).
*
"Eu ia protestar, mas ele me olhou bravo e pôs um dedo diante da boca. Pierre Dippel é um homem que não gosta de ser contrariado.
- A gente tem sempre que obedecer o senhor, não é?
Ele não me escutava.
- Será que um dia alguém já ousou contradizê-lo? (...).
- Alguém não. A minha vida inteira" - (p.56).
*
"- Mas nós somos uma grande ocasião, Chloé. Nós somos a melhor ocasião do mundo" - (p. 57).
*
" - Amei-a mais do que tudo. Mais do que tudo...
Eu não sabia que se podia amar a tal ponto...Enfim, eu, em todo caso, achava que eu não estava...programado para amar daquela maneira. As declarações, as insônias, os estragos da paixão, aquilo tudo era bom para os outros. Aliás, a simples palavra paixão me fazia rir. A paixão, a paixão! Eu punha aquilo entre a hipnose e superstição...Era quase um palavrão na minha boca. E aí, aquilo caiu sobre mim na hora em que eu menos esperava. Eu...Eu amei uma mulher.
Me apaixonei como se pega uma doença. Sem querer, sem acreditar, contra a minha vontade e sem poder me defender, e depois... (...)
- E depois a perdi. Da mesma maneira" - (p.82).
*
"O que se espera da vida aos 42 anos?
Eu, nada. Não esperava nada. Eu trabalhava. Cada vez mais e sempre. Era a minha roupa de camuflagem, a minha armadura, o meu álibi. Meu álibi para não viver. Porque eu não gostava muito disso, de viver. Eu achava que não tinha jeito para isso.
Eu inventava dificuldades, montanhas a serem escaladas. Muito altas. Muito escarpadas. Depois arregaçava as mangas. Escalava-as e inventava outras. Mesmo assim eu não era ambicioso, eu era sem imaginação" - (p.83).
*
"Eu tinha 42 anos de silêncio a recuperar, 42 anos em que eu me calava, que guardava tudo para mim (...). Por mais incrível que isso possa lhe parecer, acho que meu mutismo é antes timidez. Não gosto de mim o bastante para dar importância às minhas palavras" - (p.85).
*
"Eu não gostava daquele apartamento (...).Eu vinha naquele apartamento para dormir, e porque minha família vivia nele. Ponto" - (p.87).
*
"Não queria mais que ela existisse. Não podia mais me virar para ela. Queria que ela desaparecesse num buraco de camundongo e queria desaparecer junto com ela. E quanto mais a igonorava, mais ficava apaixonado. Era exatamente como eu dizia há pouco, como uma doença. Sabe como isso acontece... Você espirra. Uma vez. Duas vezes. Você sente um arrepio e pornto. É tarde demais. O mal está feito. Ali, era a mesma coisa: eu estava preso, estava ferrado. Não havia mais esperança alguma..." - (p.112).
*
"Durante alguns dias, eu tinha sido eu mesmo. Nem mais, nem menos que eu mesmo. Quando estava com ela, tinha a impressão de ser um sujeito legal...Era simples assim. Eu não sabia que podia ser um sujeito legal' - (p.120).
*
"Eu estava confiante. Estava cheio de energia. Acho que estava muito feliz naquela época da minha vida porque, mesmo que não estivesse com ela, eu sabia que ela existia. já era inesperado" - (p.121).
*
" - E quando tomei o avião de volta, pela primeira vez em minha vida não tive medo. Eu pensava: ele pode explodir, pode cair feito uma pedra e se arrebentar, não faz mal.
- Por que o senhor pensava isso?
- Por quê?
- É. Por quê?...Eu teria pensado o contrário...Eu teri pensado: "Agora sei realmente por que tenho medo e é melhor a porra desse avião não cair!".
- É, você tem razão. Teria sido mais esperto...Pois é, e tocamos aqui no xis do problema, eu não pensava isso. Eu devia quase até desejar que ele caísse...Minha vida teria ficado tão mais simples..." - (p.126).
*
"O casamento, a família, o trabalho, os meandros da vida social, tudo. Atravessei tudo de cabeça baixa e com os dentes cerrados. Apreendi tudo com desconfiança" - (p.127-8).
*
"...me achava velho. Pensava que era o fim do percurso. Um fim ensolarado...Eu pensava: "Não precipitemos nada, ela é tão jovem, ela é que irá embora primeiro", e, cada vez que a encontrava, ficava maravilhado mas surpreso também. Como? Ela ainda está aqui? Mas por quê? Eu via mal o que ela amava em mim, eu me dizia: "Pra que bagunçar tudo, já que é ela que vai me deixar?". Era obrigatório, era fatal. Não havia nenhuma razão para que ela estivesse ali na próxima vez, nenhuma razão...Afinal, eu acabava até desejando que não estivesse. Até então, a Vida tinha se encarregado tão bem de decidir tudo em meu lugar, por que haveria de mudar? Por quê? Eu havia de qualquer modo provado que não tinha jeito para assumir as coisas...Na minha profissão, sim, era um jogo e eu era o melhor, mas e quanto ao resto? Eu prefiria não decidir, preferia me consolar lembrando que não era eu quem decidia. Preferia sonhar ou lamentar. Era tão mais simples...
Minha tia-avó paterna, que era russa, sempre me dizia:
- Você é igual ao seu pai, você tem saudade das montanhas.
- De que montanhas, Mouchka? - eu perguntava.
- Ora! Daquelas que você não conheceu" - (p.148-9).
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"- Pois eu acho que a gente combina...Gosto de estar com você porque nunca me entedio. Mesmo quando a gente não se fala, mesmo quando a gente não se toca, mesmo quando não estamos no mesmo quarto, eu não me entedio. Não me entedio nunca. Acho que é porque tenho confiança em você, tenho confiança em seus pensamentos. Você pode entender isso? Tudo o que eu vejo em você, e tudo o que eu não vejo, eu amo. E no entanto eu conheço os seus defeitos. Mas justamente, tenho a impressão de que os meus defeitos combinam com as suas qualidades. Nós não temos medo das mesmas coisas. Até os nossos demônios cimbinam. Você vale mais do que mostra e comigo é o contrário. Eu preciso do seu olhar para ter um pouco mais de...matéria? Como se diz em francês? Constância? Quando se quer dizer que alguém é interessane por dentro?
- Profundidade?
- É isso! Eu sou como uma pipa, se ninguém segura o carretel, pfft, eu saio voando...E você, é engraçado, penso sempre que você é forte o bastante para me segurar e inteligente o bastante para me deixar escapulir...
- Por que você está me dizendo isso tudo?
- Quero que você saiba.
- Por que agora?
- Sei lá...Não é incrível encontrar alguém e pensar: com essa pessoa, eu estou bem.
- Mas por que você está me dizendo isso agora?
- Por que às vezes tenho a impressão que você não se dá conta da sorte que nós temos..." - (p.156-7).
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"Os olhos semicerrados e o coração saindo pela boca, eu pensava no desastre que tinha sido a minha vida. A felicidade estava ali e eu a havia deixado passar para não complicar a existência" (p.161).
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"- Será que aquela menininha teimosa não teria preferido viver com um pai mais feliz?" - (p.170).
 
(Eu a amava. Ana Gavalda. Rio de Janeiro: Record, 2002).
 
Trailer do filme baseado no livro:
 
Imagens do filme:
 
 
 


quarta-feira, 1 de maio de 2013

"Eis uma história apaixonante.." - Françoise Dolto

 
"Eis uma história apaixonante acontecida com uma psicanalista já falecida. Ela ilustra de maneira exemplar como uma criancinha compreende e grava as palavras sonoras de uma língua desconhecida; como essas mesmas palavras reaparecem - anos mais tarde - no corpo dessa criança ao tornar-se adulta; e como, enfim, o psicanalista desse mesmo adulto pode, por sua vez, recolher essas palavras deixando-as inscreverem-se nele, em sua própria imagem de corpo de analista. Em primeiro lugar, devo esclarecer que pouco antes de sua morte, a psicanalista Muriel Cahen me pediu que expusesse publicamente a experiência que vou lhes contar; experiência fulgurante que atravessamos juntas, ela como analisanda, eu como sua psicanalista. Sabendo-se gravemente acometida pela doença de Hodgkin e submetida a um terrível tratamento químico à base de cortisona, ela veio me consultar depois que seu antigo analista preferiu não retomar seu tratamento. Recebi-a então durante seis meses; os últimos seis meses de sua vida. Apesar da consciência aguda de sua doença, ela ignorava o prognóstico irremediavelmente fatal que a condenava. Durante essa época extremamente dolorosa, sua atividade como psicanalista prosseguira sem descanso, com uma força e coragem admiráveis.
Um dia, durante uma sessão, ela apresentou um sonho em que as palavras bizarramente pronunciadas destacavam-se nitidamente do contexto geral do sonho. Mais que palavras, tratava-se de uma série de sons incompreensíveis. Lembro-me muito bem da exclamação que se seguiu ao relato de seu sonho: "Eu ignorava que era possível sentir a felicidade que senti nesse sonho e com uma sonoridade tão curiosa". Tenho o hábito de escrever tudo o que acontece e se diz em uma sessão de análise.  É cômodo para mim, pois, se minha mão escreve, eu, por minha vez, fico completamente livre para pensar. Minha mão escreve, e eu penso. Então, naquele dia, registrei as palavras de sonoridade estranha. Antes do fim da sessão, lembrei-me de que Muriel, nascida em Londres, vivera os primeiros nove meses de sua vida na ìndia. Seu pai, funcionário inglês em missão nesse país, contratara uma moça hindu para cuidar do bebê. Pouco a pouco estabeleceu-se um tal laço afetivo entre a babá e a criança que o pai cogitava levar a jovem com eles para a Inglaterra. Esse plano verificou-se impossível, e a pequena Muriel teve de abandonar definitivamente sua primeira babá. Aparentemente, esse separação não marcara a criança.
A lembrança desses primeiros meses da vida de Muriel Cahen associou-se às palavras do sonho que eu registrava no papel. Quando a sessão terminou, e no momento da despedida, eu olhe disse, entregando-lhe o papel no qual transcrevera aqueles fonemas estranhos: "Eis a frase tal como a escutei e anotei. Seria mesmo curioso se os sons, ouvidos no sonho, fossem palavras derivadas da língua do país onde você viveu os primeiros meses". Essa idéia agradou-a tanto que ela foi consultar um residente hindu da cidade universitária que acabou apresentando-a a um compatriota que falava o dialeto da região onde o pai de Muriel exercera sua missão. Ao ler as palavras inscritas no papel, o estudante hindu começou a rir, explicando a Muriel que aquelas palavras correspondiam exatamente a uma expressão popular empregada pelas babás para ninar os bebês: "Os olhos da minha menininha são os mais belos que as estrelas". Alguns dias mais tarde, a doença de Muriel agravou-se com o surgimento de uma paraplegia indolor. Suas pernas não a carregavam mais, estavam tão imaturas quanto as de um bebê de colo (...). No sonho de Muriel, as palavras de sonoridade bizarra bão representavam justamente a articulação que liga a imagem do corpo do bebê - inacabada no nível do esquema corporal da bacia e das pernas - à imagem suporte da jovem hindu, verdadeira mãe portadora da criança antes que esta soubesse andar? Ora, a alegria indizível experimentada no sonho não passava do retorno da ternura fusional entre uma mãe portadora que fala e um bebê imaturo que sabe escutar" -
(In. A criança do espelho. Rio de Janeiro: Zahar, 2008, p.56-9).
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No filme "O dia em que não nasci", a atleta alemã Maria, de passagem pelo aeroporto da Argentina, ouve uma mulher entonar uma canção de ninar em espanhol, e sem que compreenda, aquilo a abala profundamente; movida pelo que Freud chamaria de Unheimlich, Maria fica em Buenos Aires e empreende uma busca aparentemente sem sentido que acaba por revelar a sua verdadeira origem - Maria era filha de pais argentinos que haviam sido vítimas da ditadura de Pinochet, e fora adotada por alemães.
Trailer do filme "O dia em que não nasci":
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segunda-feira, 15 de abril de 2013

A primeira noite de um homem - (trecho)


"Sinto-me muito bem com você.
(...).
Você é a primeira......
A primeira coisa agradável que me aconteceu em muito tempo.
A primeira pessoa cuja companhia eu suporto.
Toda a minha vida é uma desordem.
Uma nulidade" -
(Ben para Elaine).




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Curiosidade: "Quando o filme foi lançado em Portugal, os censores do então regime ditatorial cortaram o final. Ou seja, o longa terminava com Benjamin atrás do vidro da igreja, vendo Elaine se casar. A idéia era não deixar passar nenhum mau exemplo para a juventude - no caso, o da jovem abandonando o altar".
(Do Livreto "A primeira noite de um homem" - da cinemateca Veja. São Paulo: Editora Abril, 2008, p.51). 
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O trecho censurado em Portugal:
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"The sound of silence", de Paul Simon and Garfunkel - tema do filme: