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segunda-feira, 19 de julho de 2021

Natalia Ginzburg & a Psicanálise

 


"En el verano de 1945 comenzó un tratamiento psicoanalitico. "Deberia haberme sentido como una enferma ante un médico. Pero no me se sentia enferma, solo llena de culpas oscuras y de confusión". Durante un par de meses, anotaba todos los dás sus sueños - en un café, a las apuradas, antes de la sesión -, y se sentía como una estudiante. Luego subía, se sentaba frente al analista y hablava con él. "En su mirada nunca se apagaban la ironía y una profunda atención... La luz de su inteligencia me iluminó durante aquel verano negro". Al finalde ese verano decidió regresar a Turín. Extrañaba a sus hijos, quería volver a vivir com ellos". "No me habia liberado de mis neurosis, simplesmente había aprendido a soportalas o, al final, las había olvidado".


(In. Maja Pflug. Natalia Ginzburg: audazmente tímida. Buenos Aires: Siglo Veintiuno Editores, 2020).

sexta-feira, 16 de julho de 2021

O amigo - Sigrid Nunez

 


"Durante a década de 1980, na Califórnia, um grande número de mulheres cambojanas foi ao médico com a mesma queixa: elas não podiam enxergar. Eram todas refugiadas de guerra. Antes de fugirem de sua terra natal, elas testemunharam as atrocidades pelas quais o Khmer Vermelho, que estivera no poder de 1975 a 1979, era bem conhecido.  Muitas delas haviam sido estupradas, torturadas ou, sob outros aspectos, brutalizadas. A maioria testemunhara membros da família serem assassinados. Uma mulher, que nunca mais viu o marido e os três filhos depois que os soldados vieram e os levaram, disse que havia perdido a visão após ter chorado todos os dias durante quatro anos. Ela não era a única que parecia ter chorado até ficar cega. Outras sofriam de visão turva ou parcial, os olhos perturbados por sombras e dores. 
Os médicos que examinaram as mulheres - cerca de cento e cinquenta ao todo - descobriram que os olhos delas eram todos normais. Outros testes mostraram que o cérebro delas também era normal. Se as mulheres estivessem dizendo a verdade - e havia quem duvidasse disso, quem achasse que fingiam porque queriam atenção ou esperavam receber algum benefício graças à deficiência -, a única explicação seria cegueira psicossomática.
Em outras palavras, a mente das mulheres, forçada a absorver tanto horror e incapaz de assimilar mais, conseguiu apagar as luzes" - (pp.7-8).
*
"Eu mesmo estou inclinado a concordar com pessoas como Doris Lessing, que achava que a imaginação faz o melhor trabalho em conseguir a verdade. E não engoli essa ideia de que a ficção não é mais uma questão de retratar a realidade. Eu diria que o problema está em outro lugar. E eis outra coisa que notei os alunos: como eles se tornaram hipócritas, como são intolerantes a qualquer fraqueza ou falha no personagem criado por um escritor. E não estou falando sobre racismo e misoginia flagrantes, por exemplo. Estou falando de qualquer pequeno sinal de insensibilidade ou preconceito, qualquer prova de problema psicológico, neurose, narcisismo, obsessividade, maus hábitos.... qualquer excentricidade. Se o escritor não se encaixar no tipo de pessoa que os alunos gostariam de ter como amigo, o que invariavelmente significa alguém progressista e com um estilo de vida saudável, foda-se ele. Uma vez tive uma turma inteira concordando que não importava quão grande fosse o escritor Nabokov, um homem assim - esnobe e pervertido, conforme o viam - não deveria constar da bibliografia obrigatória de ninguém. Um romancista, como qualquer bom cidadão, tem que se sujeitar às regras, e a ideia de que uma pessoa poderia escrever exatamente o que quisesse, independentemente da opinião dos outros, era impensável para eles. É claro que a literatura não pode cumprir seu papel em uma cultura como essa. O fato de a escrita ter se tornado tão politizada me perturba, mas meus alunos estão mais do que bem com isso. Na realidade, alguns deles querem ser escritores precisamente por causa disso. E, se você se opuser a qualquer coisa, se tentar falar com eles sobre, digamos, arte pela arte, eles tapam os ouvidos, eles o acusam de "profexplicar". É por isso que decidi não voltar a lecionar. Sem querer ser auto compassivo demais, mas, quando alguém está tão em desacordo com a cultura e seus temas do momento, de que adianta?" - (pp.190-191).

(In. O amigo. Sigrid Nunez. São Paulo: Editora Instante, 2019).


Mais sobre o livro:


quinta-feira, 15 de julho de 2021

Zazie no metrô - Raymond Queneau

 


"- Então, por que é que você quer ser professora?

- Pra encher o saco das crianças - respondeu Zazie. - As crianças que tiverem a minha idade daqui a dez anos, vinte anos, cinquenta anos, cem anos, mil anos, sempre vai ter crianças para serem aporrinhadas.

(...)

 - Sabia - disse Gabriel, com calma -, segundo os jornais, não é de jeito nenhum nessa direção que caminha a educação moderna. É totalmente o contrário. Vamos na direção da suavidade, da compreensão, da gentileza. Não é isso, Marceline, o que dizem no jornal?

- É - respondeu Marceline, suavemente. - Mas violentaram você na escola, Zazie?

- Queria ver eles tentarem.

- Além disso - disse Gabriel -, daqui a vinte anos não vai mais ter professoras: vão ser trocadas pelo cinema, pela tevê, pelos eletrônicos, essas coisas. Também estava escrito no jornal, outro dia. Não é, Marceline?

- É - respondeu Marceline, suavemente.

Zazie vislumbrou aquele futuro por um instante.

- Então - declarou - vou ser astronauta.

- Isso aí - disse Gabriel, aprovando. - Isso aí, é preciso viver de acordo om os tempos.

- É - continuou Zazie -, vou ser astronauta para encher o saco dos marcianos".

(In. Zazie no metrô. Raymond Queneau. São Paulo: Cosacnaify, 2009, pp. 20-21).



quarta-feira, 14 de julho de 2021

Sim, eu a amava - Samuel Beckett

 


"Sim, eu a amava, é o nome que eu dava, que ainda dou, ai de mim, ao que eu fazia, naquela época. Eu não tinha dados sobre isso, nunca tendo amado antes, mas tinha ouvido falar da coisa, naturalmente, em casa, na escola, no bordel, na igreja, e tinha lido romances, em prosa e em verso, sob a direção do meu tutor, em inglês, francês, italiano, alemão, nos quais ele era tratado em detalhes. Portanto eu era capaz, apesar de tudo, de dar um nome ao que eu fazia, quando me via de repente escrevendo a palavra Lulu (...). Eu pensava em Lulu e, se isso não é tudo, já é o suficiente, na minha opinião. Aliás, já estou farto desse nome, Lulu, e vou lhe dar outro, de uma sílaba dessa vez, Anne por exemplo, não é uma sílaba mas não importa. Então eu pensava em Anne, eu que tinha aprendido a não pensar em nada, a não ser nas minhas dores, muito rapidamente, depois nas medidas para não morrer de fome, ou de frio, ou de vergonha, mas jamais, sob nenhum pretexto, nos seres vivos enquanto tais (eu me pergunto o que isso quer dizer), não importando o que eu possa ter dito ou possa me acontecer dizer a esse respeito. Pois eu sempre falei, sempre falarei de coisas que nunca existiram, ou que existiram, se quiserem, e que provavelmente sempre existirão, mas não com a existência que atribuo a elas (...). Eu a admirava, apesar da escuridão, apesar do meu incômodo, o modo como a água parada, ou que corre lentamente, se ergue, como que sedenta, em direção à que cai (...). É preciso considerar que eu estava fora de mim naquela época. Eu não me sentia bem ao lado dela, mas pelo menos me sentia livre para pensar em outra coisa que não ela, e isso já era enorme, nas velhas coisas experimentadas, uma depois da outra, e assim pouco a pouco em nada, como que descendo gradualmente em águas profundas. E eu sabia que, abandonando-a, perderia essa liberdade (...).Teriam sido necessários outros amores, talvez. Mas o amor não se encomenda".

(In. Primeiro amor. Samuel Beckett. São Paulo: Cosacnaify, 2004).

terça-feira, 13 de julho de 2021

Who are you? - Lina Meruane

 


"Faz-se um silêncio seguido de um lento who are you, e eu tento explicar a ela quem acredito ser. Há então um momento de agitação na linha, a convulsão de uma língua que tenta traduzir o que lhe digo e que, pressionada a dizer algo, começa a gritar a única palavra que tem a mão. Aaaaa! Family!, diz, num grande alvoroço, family! family!, e eu, sem saber mais o que dizer, respondo yes, yes, e começo a rir porque há estardalhaço e há exagero e há confusão nessa palavra, e há também um enorme vazio de anos de mar e de possível pobreza, mas, a cada family que ela grita, mais eu rio, dizendo yes, family, yes, como se tivesse esquecido todas as outras palavras. E nesse tiroteio telefônico não sei se consigo lhe dizer ou se ela terá compreendido que estou prestes a viajar, ou retornar, e que meu desejo é ir vê-las" - (p. 51) 

(...)

"Enquanto lava os pratos e panelas e todos os copos sujos do dia, Zima diz ter compreendido com o tempo que sua família não havia traído: permanecer é continuar marcando a presença de uma cidadania palestina que os israelenses tentam negar (...). E que a condição de refugiados para os palestinos, e só para eles, para nós, é hereditária. É importante defender esta herança, não porque todos estejam sofrendo, mas porque foram deslocados por circunstâncias histórica. O que importa é não perder a possibilidade de retorno. Reivindicá-lo" - (pp. 86-87).

(In. Tornar-se Palestina. Lina Meruane. Minas Gerais: Relicário, 2019).

Mais sobre o livro:

https://www.quatrocincoum.com.br/br/resenhas/p/retornar-e-preciso

https://piaui.folha.uol.com.br/materia/tornar-se-palestina/