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segunda-feira, 23 de abril de 2018

Lacan & Foucault - Liberdade de expressão

"Além das conjunções de ordens estritamente teórica e institucional, na passagem dos anos 60 para os anos 70, Lacan e Foucault se aproximaram também no plano político. A questão que os reuniu foi a primeira mobilização de jornalistas franceses na defesa da liberdade de expressão.
Assim, o que estaria em pauta foi o que ficou conhecido como o "affaire Jaubert". Jaubert era o nome do jornalista da revista semanal Le Nouvel Observateur que foi agredido pela polícia parisiense no contexto de uma manifestação dos Atilheses, em Paris, na primavera de 1971. Com efeito, Jaubert foi violentamente agredido por policiais quando prestava os primeiros socorros a uma pessoa ferida na manifestação. O Ministério do Interior, além disso, indiciou então Jaubert, por ter supostamente agredido e insultado policiais, na tentativa de justificar o injustificável, qual seja, a agressão realizada pelos policiais contra o jornalista.
Em reação a isso foi então organizada uma comissão para investigar o que tinha de fato tinha acontecido, pois se desconfiava fortemente da versão da polícia. Esta comissão era formada por advogados, intelectuais e jornalistas e diferentes órgãos da imprensa, com colaborações políticas e editoriais diferentes, como Le Fígaro, Le Monde e Le Nouvel Observateur. O que estava em pauta efetivamente era a defesa ostensiva da liberdade de expressão pela comissão que se organizou para avaliar os acontecimentos, que o preocupante episódio em questão evidenciava.
Uma grande conferência de imprensa foi então realizada em 21 de junho de 1971, com a presença de Claude Mauriac, Denis Langlois, o advogado da Liga dos Direitos do Homem, assim como de Gilles Deleuze e de Michel Foucault. A primeira reunião deste grupo se realizara há poucas semanas, no consultório de Lacan, contando assim com a participação deste.
A consequência disso foi a constituição de outra comissão de inquérito que comprovou que a polícia mentira sobre o que se passara efetivamente, para tentar justificar de fato o injustificável, qual seja, a agressão ao jornalista como vingança da polícia para quem ajudasse os manifestantes a se defenderem da violência policial. Enfim, a liberdade de expressão e de manifestação foi então mantida, não obstante as posições não-republicanas da polícia e do Ministério do Interior em relação ao acontecimento.


(In. Lacan e Foucault -conjunções, disjunções e impasses. Joel Birman e Christian Hoffmann. São Paulo: Instituto Langage, 2017, pp. 130-131).