"Resumo em mim a herança terrestre e o estado do universo neste instante. Todo bom biógrafo sabe que, para que conheçam seu herói, ele deve inicialmente evocar a época, a civilização, a sciedade à qual aquele pertence - e também remontar o mais longe possível a cadeia de seus ascendentes. A soma de tais informações é, no entanto, ínfima se a confrontarmos com a inesgotável multiplicidade de relações que cada elemento de uma existência mantém com o Todo. Cada um tem, além disso, uma significação diferente, quer o consideremos sob um ponto de vista ou sob outro. Este fato: 'nasci em Paris' não representa a mesma coisa aos olhos de um parisiense, de um provinciano, de um estrangeiro. Sua aparente simplicidade se dispersa através dos milhões de indivíduos que mantêm relações diversas com a cidade de Paris.
E, no entanto, uma vida é também uma realidade finita. Tem um centro de interiorização, um eu que, através de todos os momentos, se coloca como idêntico (...). Não se pode captar e cingir uma vida como se capta e cinge uma coisa (...). Mas podemos fazer-nos algumas perguntas a seu respeito: como se faz uma vida? qual é nela a contribuição das circunstâncias, da necessidade, do acaso, das escolhas e das iniciativas do sujeito?"
(In. Balanço Final. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1972, p.10).