Pesquisar este blog

terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Memorial do convento - Saramago (trechos)


"...e eu te verei se no meio dessa multidão estiveres, que só para te ver quero agora os olhos, a boca me amordaçaram, não os olhos, olhos que não te viram, coração que sente e sentiu, ó coração meu, salta-me no peito se Blimunda aí estiver..." (p.53).


"Porque, enfim, podemos fugir de tudo, não de nós próprios" - ( p.70).


"Dormiu cada qual como pôde, com seus próprios e secretos sonhos, que os sonhos são como as pessoas, acaso parecidos, mas nunca iguais, tão pouco rigoroso seria dizer Vi um homem, como Sonhei com água a correr, não chega isto para sabermos que homem era nem que água corria, a água que correu no sonho é água só do sonhador, não saberemos o que ela significa ao correr se não soubermos que sonhador é esse, e assim vamos do sonhador ao sonhado, do sonhado ao sonhador, perguntando, Um dia terão lástima de nós as gentes do futuro por sabermos tão pouco e tão mal" - ( p.121)
 
 
"Já sabemos que destes dois se amam as almas, os corpos e as vontades, porém, estando deitados, assistem as vontades e as almas ao gosto dos corpos, ou talvez ainda se agarrem mais a eles para tomarem parte no gosto, difícil é saber que parte há em cada parte, se está perdendo ou ganhando a alma quando Blimunda levanta as saias e Baltasar descalça as bragas, se está a vontade ganhando ou perdendo quando ambos suspiram e gemem, se ficou o corpo vencedor ou vencido quando Baltasar descansa em Blimunda e ela o descansa a ele, ambos se descansando" - ( 137-8).
*
"Durante muitas horas desse dia não verá Baltasar o rosto de Blimunda, ela sempre adiante, avisando se tem de voltar-se, é um estranho jogo o destes dois, nem um quer ver, nem o outro quer ser visto, parece tão fácil, e só eles sabem quanto lhes custa não se olharem. Por isso, lá pelo fim do dia, quando Blimunda já tiver comido e os seus olhos regressarem à comum humanidade, Baltasar poderá sentir acordar o seu próprio e entorpecido corpo, menos cansado da caminhada que de não ser olhado" - (p.179).
 

"Tudo no mundo está dando respostas, o que demora é o tempo das perguntas"
*
"Desprendeu-se a vontade de Baltasar Sete-Sóis, mas não subiu para as estrelas, se à terra pertencia e a Blimunda" .

(In. Memorial do convento. Rio de Janeiro: Bertrand, 1989).

Um comentário: