"E era mesmo importante, oh se era! Haveria brancos a assistir, e dois ou três falariam sobre Deus e o lar, o estilo de vida sulista, e Mrs. Parsons, a mulher do director, tocaria a marcha da cerimónia, enquanto os finalistas da primária desfilariam pelas coxias e se sentariam abaixo do estrado. Os finalistas do liceu esperariam nas salas de aulas vazias para depois fazerem a sua entrada triunfal.
(...)
O meu trabalho, por si só, granjeara-me um lugar cimeiro e eu seria uma das primeiras a subir ao estrado da cerimónia de final de ano (...). Nem faltas, nem atrasos, e o meu trabalho curricular estava entre os melhores do ano. Conseguia recitar a Constituição mais depressa do que o Bailey.
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A banda da escola começou a tocar uma marcha e todas as turmas desfilaram como tinham ensaiado. (...)
Donleavy olhou para o público uma vez (...), ajustou os óculos e começou a ler um molho de papéis.
Alegrava-se por estar ali e ver o trabalho realizado, exactamente como nas outras escolas.
(...)
Contou-nos as maravilhosas mudanças que nos esperavam, a nós, crianças de Stamps. Já tinham sido aprovados melhoramentos para a Escola Central (como é óbvio, a escola de brancos era a Central), que entrariam em vigor no início do ano seguinte. Um artista muito conhecido viria de Little Rock dar aulas de educação visual. O laboratório ia receber novíssimos microscópios e equipamento de química. Mr. Donleavy não nos deixou muito tempo sem saber quem é que tornara possíveis esses melhoramentos na Escola Central. E que nós não seríamos ignorados no esquema geral de melhoria que ele tinha em mente.
Disse que tinha referido a pessoas das altas esferas que um dos melhores jogadores da equipa de futebol da Escola Agrária e Técnica de Arkansas tinha estudado na óptima Escola Profissional do Condado de Lafayette. Aqui, ouviram-se menos ámens. Os que interromperam ficaram a pairar com o peso e a insipidez do hábito.
Em seguida pôs-se a elogiar-nos. Contou o quanto enaltecera o facto dos melhores jogadores de basquetebol da Universidade de Fisk ter encestado a sua primeira bola aqui mesmo, na Escola Profissional do Condado de Lafayette.
Os miúdos brancos iam poder tornar-se Galileus e Madames Curies e Edisons e Gauguins, e os nossos rapazes (as raparigas nem sequer eram incluídas nos planos) tentariam ser Jesse Owenses e Joe Louises.
Owens e o Bombardeio Negro eram grandes heróis do nosso mundo, masque direito tinha um funcionário do ensino do reino branco de Little Rock de decidir que esses dois homens seriam os nossos únicos heróis? Quem é que resolveu que para Henry Read poder comprar um mísero microscópio e se tornar cientista teria de trabalhar como George Washington Carver, a engraxar sapatos?
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As palavras mortas do fulano caíram como tijolos no auditório e muitas delas - demasiadas - aterraram-me na barriga. Constrangida pelas boas maneiras que tinha aprendido à força, eu não podia olhar para trás, mas à minha direita e à minha esquerda, a orgulhosa turma que terminava ocurso em 1940 tinha deixado cair a cabeça. Todas as meninas da minha fila tinham arranjado uma coisa nova para fazer com os seus lencinhos. Umas dobravam os quadradinhos minúsculos em laços românticos, outras em triângulos, mas a maior parte amassava-os e depois alisava-os no colo amarelo.
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A cerimônia de fim de curso, esse momento mágico de sussurros, folhos, prendas, felicitações e diplomas, acabou para mim antes mesmo de proferirem o meu nome. O que eu conquistara não era nada. Os mapas meticulosos, desenhados a tinta de três cores diferentes, aprender a soletrar palavras decassilábicas, decorar todo O Rapto de Lucrécia... não servira para nada. Donleavy desmascarara-os.
Éramos criadas e lavradores, biscateiros e lavadeiras, e qualquer aspiração a algo mais do que isso não passava de uma farsa e uma presunção.
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Era horrível ser negra e não ter controlo nenhum sobre a minha vida. Era brutal ser jovem e já me terem domado para ficar sossegadinha a ouvir acusações feitas contra a minha cor, sem hipótese de me defender. Devíamos estar mortos, todos nós (...). Enquanto espécie, éramos uma abominação. Todos nós".
(In. Maya Angelou. Sei porque canta o pássaro na gaiola. Lisboa: Antígona: 2017, pp.173-183).
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