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sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Na calma amorosa de seus braços - Roland Barthes

Abraço: o gesto do abraço amoroso parece realizar, por um instante, para o sujeito, o sonho de união total com o ser amado.
"O abraço", Klimt

Além do acasalamento (aos diabos com o Imaginário), há este outro abraço, que é um enlaçamento imóvel: estamos encantados, enfeitiçados: estamos no sono, sem dormir; estamos na volúpia infantil do adormecer: é o momento das histórias contadas, o momento da voz, que vem me hipnotizar, me siderar, é o retorno à mãe ("na calma amorosa de seus braços", diz uma poesia musicada por Duparc). Nesse incesto renovado, tudo fica então suspenso: o tempo, a lei, o interdito: nada se esgota, nada se quer: todos os desejos são abolidos porque parecem definitivamente satisfeitos.
Contudo, durante esse abraço infantil, o genital acaba irremediavelmente por surgir; ele corta a sensualidade difusa do corpo incestuoso; a lógica do desejo põe-se em marcha, o querer-possuir retorna, o adulto se justapõe à criança. Sou então dois sujeitos ao mesmo tempo: quero a maternidade e a genitalidade. (O amante poderia assim ser definido: uma criança de pau duro: assim era o jovem Eros).

Carrie & Big, em "Sex and the city", o filme

Movimento de afirmação; durante um certo tempo, na verdade acabado, perturbado, alguma coisa deu certo: fiquei saciado (todos os meus desejos abolidos pela plenitude da satisfação): a plenitude existe, e não descansarei até fazê-la voltar: através de todos os meandros da história amorosa, obstinar-me-ei a querer reencontrar, renovar a contradição - a contração - dos dois abraços.
(In: Fragmentos de um discurso amoroso. Sâo Paulo: Martins Fontes, 2010. p7-8).

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