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segunda-feira, 17 de junho de 2013

Entrada - Manoel de Barros

"Distâncias somavam a gente para menos. Nossa morada estava tão perto do abandono que dava até para a gente pegar nele. Eu conversava bobagens profundas com os sapos, com as águas e com as árvores. Meu avô abastexcia a solidão. A natureza avançava nas minhas palavras tipo assim: O dia está frondoso em borboletas. No amanhecer o sol põe glórias no meu olho. O cinzento da tarde me empobrece. E o rio encosta as margens na minha voz. Essa fusão com a natureza tirava de mim a liberdade de pensar. Eu queria que as garças me sonhassem. Eu queria que as palavras me gorjeassem. Então comecei a fazer desenhos verbais de imagens. Me dei bem (...). Acho-os como os impossíveis verossímeis de nosso mestre Artistóteles. Dou quatro exemplos: 1) É nos loucos que grassam luarais; 2) Eu queria crescer pra passarinho; 3) Sapo é um pedaço de chão que pula; 4) Poesia é a infância da língua. Sei que os meus desenhos verbais nada significam. Nada. Mas se o nada desaparecer a poesia acaba. Eu sei. Sobre o nada tenho profundidades"

(In. Manoel de Barros. Poesia Completa. São Paulo: Leya, 2010, p.7).

Um comentário:

  1. Manoel é um encantamento contínuo... Adoro esta 'Entrada'. Obrigada por partilhar!

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