Una axolotl lectora
Artes, Psicanálise e afins.
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sábado, 15 de fevereiro de 2025
A avestruz - Jacques Prévert
quinta-feira, 13 de fevereiro de 2025
Minhas férias com Franz Kafka - (fragmentos)
"Nossa sentença não parece severa. O mandamento que o condenado infringiu está inscrito em seu corpo com o rastelo. Por exemplo, para este condenado - o oficial apontou para o homem - será escrito no corpo: "Honre seus superiores!" (...). O viajante queria perguntar algo diferente mas apenas questionou, ao olhar o homem:
- Ele sabe qual é a sentença?
- Não - respondeu o oficial. E quis, de pronto, continuar suas explicações, mas o viajante o interrompeu:
- Ele não sabe qual é a própria sentença?
- Não - repetiu o oficial. Parou por um momento, como se exigisse um fundamento mais específico da pergunta do viajante, e, então, e, então, disse: - Seria inútil anunciá-la. Ele a sentirá na carne.
O viajante quis se calar, mas sentiu que o condenado voltava o olhar para ele, parecendo perguntar se ele endossava o processo descrito. Por isso, o viajante se curvou para a frente de novo, pois já havia recuado, e voltou a perguntar:
- Mas ao menos ele soube que foi condenado?
- Também não - disse o oficial. Ele sorriu para o viajante, como se esperasse dele mais alguma observação peculiar.
- Não - repetiu o viajante, passando passando a mão pela testa -, então o homem tampouco sabe como sua defesa foi feita?
- Ele não teve a oportunidade de se defender - comentou o oficial e olhou para o lado, como se falasse para si mesmo e não quisesse envergonhar o outro por ter que explicar coisas tão óbvias".
(In. Na colônia penal. Rio de Janeiro: Antofágica, 2020, pp. 35-39).
***
"... sou o que sou como resultado da sua educação e da minha obediência (além dos fundamentos e da influência da vida, é claro). O fato de você ainda se atormentar com esse resultado, sim, de se recusar inconscientemente a reconhecê-lo como resultado de sua educação, é precisamente porque sua mão e meu material eram tão estranhos um ao outro".
(In. Carta ao pai. Rio de Janeiro: Antofágica, 2024, p.45).
***
"Gregor não poderia ser demitido de imediato. E para Gregor parecia ser muito mais razoável que o deixassem em paz no momento em vez de perturbá-lo com choros e tentativas de persuasão. Mas era exatamente a incerteza que afligia os outros que justificava o modo como se comportavam".
(In. A metamorfose. Rio de Janeiro: Antofágica, 2019, p. 55).
quarta-feira, 5 de fevereiro de 2025
A última névoa - Maria Luisa Bombal (trecho)
"Uma vez nua, permaneço sentada à beira da cama. Ele se afasta e me contempla. Sob seu olhar atento, jogo a cabeça para trás e esse gesto me enche de um íntimo bem-estar. Junto os braços atrás da nuca,, tranço e destranço as pernas e cada movimento traz consigo um prazer intenso e completo como se, por fim, meus braços, meu colo, minhas pernas encontrassem uma razão de ser. Ainda que este prazer fosse a única finalidade do amor, me sentiria já bem recompensada!
Aproxima-se; minha cabeça fica à altura de seu peito, que ele me oferece sorridente, aperto contra ele meus lábios e logo encosto a testa, o rosto. Sua carne cheira a fruta, a vegetal. Num novo impulso, jogo os braços ao redor de seu torso e atraio, mais uma vez, seu peito contra a minha ace.
Abraço-o com força e ouço com todos os meus sentidos. Ouço nascer, voar e recair sua respiração; escuto a explosão que seu coração repete incansável no centro do peito e que repercute nas estranhas e se espalha em ondas pelo corpo todo, transformando cada célula num eco sonoro. Aperto-o, aperto sempre com maior afã; sinto correr o sangue em suas veias e sinto trepidar a força que se esconde inativa em seus músculos; sinto agitar-se a borbulha de um suspiro. Entre meus braços, toda uma vida física, com sua fragilidade e mistério, fervilha e se precipita. Começo a tremer.
Então ele se debruça sobre mim e rolamos enlaçados para o centro da cama. Seu corpo me cobre como uma grande onda fervente, me acaricia, me queima, me penetra, me envolve, me arrasta desfalecida. à minha garganta sobe algo assim como um soluço, e não sei por que começo a me queixar, não sei por que é doce me queixar, é doce para o meu corpo o cansaço infligido pela preciosa carga que pesa sobre minhas coxas.
Quando acordo, meu amante dorme estendido ao meu lado. A expressão de seu rosto é plácida; seu hálito é tão leve que preciso me inclinar sobre os lábios dele para senti-lo. Percebo que, presa a uma finíssima e quase imperceptível corrente, uma medalhinha se aninha na penugem castanha do peito; uma medalhinha trivial, dessas que as crianças recebem no dia da primeira comunhão. Minha carne toda se enternece diante desse detalhe pueril. Aliso uma mecha rebelde colada à sua têmpora, ergo-me sem acordá-lo. Visto-me com cuidado e vou-me embora. Saio como cheguei, tateando.
Já estou aqui fora. Abro a grade. As arvores estão imóveis e ainda não amanheceu. Subo correndo a ruela, atravesso a praça, retomo avenidas. Um perfume muito suave acompanha-me: o perfume do meu enigmático amigo. Fiquei toda impregnada do seu aroma. E é como se ele ainda caminhasse ao meu lado ou ainda me tivesse apertada em seu abraço ou tivesse desfeito sua vida em meu sangue para sempre (p. 29-31).
Não importa que meu corpo fique murcho, se conheceu o amor! Que importa que os anos passem odos iguais? Tive uma bela aventura uma vez...Com uma única lembrança se pode suportar uma longa vida de tédio. E até repetir, dia após dia, sem cansaço, os mesquinhos gestos cotidianos (p. 33).
Não veio ninguém, nada aconteceu. A amargura da decepção não dura mais do que o lapso de um segundo. Meu amor por "ele" é tão grande que está acima da dor da ausência. Basta-me saber que existe, que sente e se lembra em algum canto deste mundo... - (p. 34).
E se chegasse a esquecer, como faria então para viver?
Bem sei agora que os seres, as coisas, os dias não são suportáveis para mim, a não ser quando vistos através do estado de vida que minha paixão cria.
Meu amante é para mim mais do que um amor; é minha razão de ser, meu passado, meu agora, meu amanhã" - (p. 54).
(In. A última névoa & A amortalhada. São Paulo: Cosac Naify, 2013).
sexta-feira, 26 de janeiro de 2024
Sobre poesia e Filosofia - um depoimento - Orides Fontela
“Alta agonia é ser, difícil prova” é o primeiro verso de um soneto meu, escrito aos 23 anos — um soneto muito importante para mim, pois é uma espécie de programa de vida, que não renego nunca e nem jamais conseguirei cumprir, porém é minha tarefa tentar. Difícil prova, sim, impossível, pois isso constitui propriamente o humano. E, claro, todas as ferramentas servem, principalmente, à religião (sobre o aspecto místico), à poesia — intuições básicas e... musicais, que tive de nascença — e, a bem mais recente, à filosofia. Deixando a religião de lado (mas fica lá, por baixo), falemos só de poesia e filosofia.
Arcaica como o verbo é a poesia, velha como o cântico. A poesia, como o mito, também pensa e interpreta o ser, só que não é pensamento puro, lúcido. Acolhe o irracional, o sonho, inventa e inaugura os campos do real, canta. Pode ser lúcida, se pode pensar — é um logos — mas não se restringe a isso. Não importa: poesia não é loucura nem ficção, mas sim um instrumento altamente válido para apreender o real — ou pelo menos meu ideal de poesia é isso. Depois é que surgem o esforço para a objetividade e a lucidez, a filosofia. Fruto da maturidade humana, emerge lentamente da poesia e do mito, e inda guarda as marcas de co-nascença, as pegadas vitais da intuição poética. Pois ninguém chegou a ser cem por cento lúcido e objetivo, nunca. Seria inumano, seria loucura e esterilidade. Bem, aí já temos uma diferença básica entre poesia e filosofia — a idade, a técnica, não o escopo. Pois a finalidade de entender o real é sempre a mesma, é “alta agonia” e “difícil prova” que devemos tentar para realizar nossa humanidade. Isso é o que temos a dizer, inicialmente, sobre a filosofia e poesia.
Bem, fazer poesia fiz sempre, e curiosa sempre fui. “Que bicho é esse?” era minha pergunta de aluninha. “Ti esti”, “que é”, pergunta o filósofo. É pergunta igual... Aos dezesseis anos fiz os seguintes versos:
Pensar dói
e não adianta nada.
Maus versos, mas intuição válida. Pensar dói mesmo, faz cócegas, pode ser tão irreprimível como a curiosidade da aluninha. E de que adianta? Bem, o caso é que eu não engolia, nem engulo, respostas já prontas, quero ir lá eu mesma, tentar. Tentava pela poesia. Ora, uma intuição básica de minha poesia é o “estar aqui” — autodescoberta e descoberta de tudo, problematizando tudo ao mesmo tempo. Só que este “estar aqui” é, também, estar “a um passo” — de meu espírito, do pássaro, de Deus — e este um passo é o “impossível” com que luto. É o paradoxo que exprimo num poemeto.
Próxima: mas ainda
estrela
muito mais estrela
que próxima.
Ora, esta posição existencial básica de meus poemas já é filosófica, isto é, seria possível desenvolvê-la em filosofia, e daí veio meu interesse pela filosofia propriamente dita. Eu vivia a intuição quase inefável de estar só “a um passo”, que bastava erguer um só véu. Mocidade! E aí entra na minha vida a filosofia explícita. Entrou em aulas da Escola Normal, entrou pelos livros que procurei conseguir (Pascal, Gilson, Maritain, e até alguns não tão ortodoxos), e misturou-se a um interesse pela mística — Huxley, Sta. Tereza, São João da Cruz. Salada de que resultou meu livro “Transposição”, muito “abstrato” e “pensado” — no sentido poético de tais termos. Girava em torno do problema do ser e da lucidez, e abusava do termo “luz”. Um livro estranho, que só recentemente percebi como estava na contramão da poesia brasileira, sensual e sentimental. Parecia até meio cabralino devido a um vezo analítico, mas nunca foi, claro. Era um livro escrito no interior, tramado pelas tendências já levantadas, e onde já poesia e filosofia tentavam se irmanar, como possível.
Não preciso explicar, agora, porque meu interesse por filosofia era quase inato, como a poesia. Assim, agarrei a oportunidade de fazer realmente filosofia. Talvez desse em algo prático (não deu), mas o que me interessava era, acreditem ou não, a Verdade. Ingenuidade? Hoje sei que era, mas era a própria ingenuidade nobre sem a qual não se cria. E lá parti eu para tentar a filosofia, continuando com a poesia naturalmente. E o curioso é que estas águas não se mesclaram mais do que já estavam, senão a poesia poderia se tornar seca e não espontânea. Mas dei sorte (!) de não me tornar filósofa... Aliás, o mais que conseguiria seria ser uma professora de filosofia, isto é, uma técnica no assunto — e, bom, não era essa a finalidade. Nem dava; faltava base econômica e cultural. Pobre e vindo apenas do Normal só consegui terminar o curso. Mas me diverti muito.
Não, concluí, a filosofia propriamente dita não é exatamente meu caminho, aliás nem mesmo me considero intelectual, só poeta, e ponto. Melhor criar que comentar, claro. A filosofia não me deu a resposta, a poesia só dá intuições, a estrela próxima está cada vez mais longe, mas continue-se a escrever...
Se fiquei insatisfeita com a filosofia explícita, isso não significa que foi inútil. Deu uma base cultural que eu não tinha, alargou meu mundo. E me deu o “status” de “filósofa”, universitária. É mais ou menos mito, mas mitos são excelentes para promover livros.
A poesia foi indo, como deu. Preocupou-se com a forma, a técnica — Helianto, do tempo da faculdade — e chegou à meta-poesia — Alba. Depois tentei voltar, tornar o papo mais concreto — Rosácea, Teia. Mais próxima do cotidiano, mais sofrida, é como ela está, e eu também. Consequências da pobreza, do envelhecimento, das mágoas. Lamento ter perdido a passada ingenuidade (e imunidade) mas não que mudei de pele, não é possível. O futuro é propriamente falando o imprevisível — e não sei onde a pesquisa poética e o pensamento selvagem me levarão. E inda acrescentei à minha salada o zen-budismo — com bons resultados, aliás — e agora procuro outros “ingredientes”, se possível. Não estar satisfeita é bem humano.
O soneto a que me referi no princípio fala em
despir os sortilégios, brumas, mitos.
e taí uma tarefa bem filosófica, se a filosofia fosse só consciência crítica e lucidez, se não alimentasse também brumas e mitos próprios. Sem o que estaríamos tão nus que morreríamos, ou quem sabe — transmutávamo-nos —. Persigo a
aguda trama
da meta
morfose,
e, para isso, poesia, filosofia, zen e o mais que vier, tudo serve — ruma ao não-dito, ao nunca dito, ao inexprimível.
Noutro poema, digo
Amor
cegueira exata.
e, entendendo-se “amor” como a energia criativa primordial, então o saber poético se dá como uma “cegueira exata”: intuição, pensamento selvagem. A poesia, claro, não apresenta provas: isto é tarefa para a filosofia. Mas os filósofos — os criativos mesmo — também partem de intuições, e é a poesia que dá o que pensar. Que dizer dos incitantes fragmentos de Heráclito? Mistério religioso? Filosofia? Poesia? Tudo junto! E de Platão, aliás também poeta? E de Heidegger — que confesso ter lido como poesia — que, afinal, acaba no poético, por tentar algo indizível? Há muita poesia na filosofia, sim. Não poesia didática — como a dos pré-socráticos — mas poesia como fonte que incita e embriaga. E da filosofia na poesia já falamos, só que é “filosofia” que se ignora, que canta — que dá nervo aos poemas e tenta entrar onde o raciocínio não chega.
Filósofos podem servir de exemplo aos poeta, como digo
Sócrates
fiel ao seu daimon.
pois, como os poetas, Sócrates era inspirado — e era fiel a sua inspiração. Só isso cabe ao poeta: ser fiel à voz interior, sem forçar, sem filosofar explicitamente. Deixar que, naturalmente, filosofia e poesia se interpenetrem, convivam, colaborem.
Nasceram juntas, sob a forma de mito, e juntas sempre, sempre colaboram para criar e renovar a nossa própria humanidade".
terça-feira, 17 de outubro de 2023
Jennifer Zambra - por Alejandro Zambra
terça-feira, 22 de agosto de 2023
Não é um rio - Selva Almada (trecho)
"Justo nessa hora um vento se mete pelas árvores, e tudo está tão calado, por conta da hora, que o rumor das folhas cresce como a respiração de um animal enorme. Escute só como respira. Um bufar. Os galhos se mexem como costelas, inflando-se como o ar que se mete pelas entranhas.
Não são apenas árvores. Nem arbustos.
Não são apenas pássaros. Nem insetos.
O jacurutu não é um gato-do-mato, se bem que às vezes, pareça.
Não são uns preás. É este preá.
Esta urutu.
Este caraguatá, único, com seu centro vermelho como o sangue de uma mulher.
Se espicha a vista, descendo a rua, chega a ver o rio. Um brilho que umedece os olhos. E de novo: não é um rio, é este rio. Aguirre passou mais tempo com ele que com qualquer pessoa.
Pois bem.
Quem lhes deu permissão?
Não era uma arraia. Era aquela arraia. Um bicho lindo, toda aberta no barro do fundo, devia estar brilhando branca feito uma noiva na profundidade sem luz. Rente ao limo ou planando com seus tules, magnólia das águas, procurando comida, perseguindo a transparência das lavas, as raízes esqueléticas. Os anzóis enganchados nas asas, os puxões ao longo da tarde inteira, até que se desse por vencida. Os tiros. Arrancada do rio só para ser devolvida depois.
Morta".
(Não é um rio. São Paulo: Todavia, 2021, p. 51-52).
![]() |
Com Selva Almada, em SP - Agosto/2023. |
terça-feira, 18 de abril de 2023
O tempo entretanto corria...... Dino Buzzati
"O tempo entretanto corria, cada vez mais precipitadamente a vida com sua batida silenciosa, não se pode parar um segundo sequer, nem mesmo para olhar para trás. "Pare, pare!", se desejaria gritar, mas vê-se que é inútil. Tudo se esvai, os homens, as estações, as nuvens; e não adianta agarrar-se às pedras, resistir no topo de algum escolho, os dedos cansados se abrem, os braços se afrouxam, inertes, acaba-se arrastado pelo rio, que parece lento, mas não para nunca.
Dia após dia Drogo sentia aumentar essa ruína, e em vão tentava estancá-la. Na vida uniforme do forte faltavam-lhe pontos de referência, e as horas lhe fugiam antes que eles conseguisse contá-las.
Havia também a esperança secreta pela qual Drogo dissipara a melhor parte da vida. Para alimentá-la, sacrificava levianamente meses e meses, e nunca era suficiente. O inverno, o longuíssimo inverno do forte, não foi senão uma espécie de adiamento. Terminado o inverno, Drogo ainda esperava.
"Chegando a boa estação", pensava ele, "os estrangeiros retomarão os trabalhos da estrada". Mas não estava mais disponível a luneta de Simeoni, que permitia vê-los. Todavia, com a sequência dos trabalhos - sabe-se lá quanto ainda seria preciso-, os estrangeiros se aproximariam e um belo dia chegariam ao alcance das velhas lunetas consignadas a alguns corpos de guarda.
Por isso, Drogo deixara de estabelecer o prazo de sua espera na primavera, transferindo-o para alguns meses mais tarde, sempre na hipótese de que a estrada estivesse realmente sendo construída. E devia matutar todos esses pensamentos em segredo, porque Simeoni, com medo de aborrecimentos, não queria mais saber de nada disso, os demais companheiros fariam pouco dele, os superiores desaprovavam fantasias daquele tipo.
(...). Aos poucos a fé se enfraquecia. É difícil acreditar numa coisa quando se está sozinho e não se pode falar com ninguém. Justamente naquela época Drogo deu-se conta de que os homens, ainda que possam se querer bem, permanecem sempre distantes; que, se alguém sofre, a dor é totalmente sua, ninguém mais pode tomar para si uma mínima parte dela; que, se alguém sofre, os outros não vão sofrer por isso, ainda que o amor seja grande, e é isso o que causa a solidão da vida.
A fé começava a se cansar e a impaciência crescia, enquanto Drogo ouvia que as batidas do relógio se tornavam cada vez mais densas".
sexta-feira, 7 de abril de 2023
O sexo como uma coisa natural e vital - D. H. Lawrence
(In. O amante de lady Chattterley. Rio de Janeiro: Antofágica, 2022, p. 402).
Uma sensualidade absoluta e fervorosa - D. H. Lawrence
(In. O amante de lady Chatterley. Rio de Janeiro: Antofágica: 2022, p. 383).
quarta-feira, 1 de março de 2023
Talvez toda essa higiene de não ter esperança seja um pouco ridícula... - Adolfo Bioy Casares
sábado, 31 de dezembro de 2022
La tendencia a querer comprenderlo todo - Javier Marias
segunda-feira, 23 de agosto de 2021
No tempo da minha memória somos pra sempre - Aline Bei
"Em são paulo
o Vento ganhou banho,
levou ponto,
tomou vacina.
e o veterinário disse que foi corajoso
meu ato
sorri sem jeito.
-ele ficou até com cara de menino - eu disse
passando a mão no pelo dele.
-não ficou? mas olha,
foi bom você ter falado nisso.
porque mesmo que não dê pra gente saber qual é a
idade exata dele,
dá pra saber que ele já é bem idoso.
- claro. - respondi.
entendendo que o tempo
sempre leva
as nossas coisas preferidas no mundo
e nos esquece aqui
olhando pra vida
sem elas.
em casa eu disse pro Vento
- Chegamos.
ele me ouviu de lado
batendo o rabo
no vaso
que espatifou no chão.
-deixa pra lá, depois eu limpo.
ele subiu no sofá,
se ajeitou como pode naquilo que, com certeza,
era a melhor cama que ele já teve, os olhos
derramando porto
mais que vinho.
- não me importo - eu disse pra ele - que seja breve o
nosso encontro.
porque no tempo da minha
memória
somos pra sempre. não existe morrer dentro, é como
uma canção.
as canções não morrem nunca porque elas moram
dentro das pessoas que gostam delas. você conhece
aquela da rua? se
essa rua
se essa rua fosse minha?
eu mandava eu mandava ladrilhar
com pedrinhas com pedrinhas de brilhante
para o meu
para o meu
Vento passar. nessa rua nessa rua tem um bosque. que
se chama que se chama solidão.
dentro dele dentro dele mora um
Vento
que roubou
que roubou meu
coração " - (pp. 111-113).
(In. O peso do pássaro morto. Aline Bei. São Paulo: Editora Nós, 2017).
Comentário: Pelo grito nascemos. E na dor vivemos. Mas se tivermos sorte vamos morrendo um pouquinho por vez até chegar o dia em que para definitivamente de doer. Existem situações entretanto que abrem um buraco no eu por onde escorremos até não sobrar nada além de um autômato que espera o fim que venha formalizar a morte. Esta espera é pior que qualquer dor. "O peso do pássaro morto" faz Arte da dor....o tipo de Arte que nos ajuda a não morrer em vida. Que beleza.....
O mapeador de ausências - Mia Couto
(In. Mia Couto. O mapeador de ausências. São Paulo: Companhia das Letras, 2021 - edição especial TAG).
segunda-feira, 19 de julho de 2021
Natalia Ginzburg & a Psicanálise
sexta-feira, 16 de julho de 2021
O amigo - Sigrid Nunez
quinta-feira, 15 de julho de 2021
Zazie no metrô - Raymond Queneau
"- Então, por que é que você quer ser professora?
- Pra encher o saco das crianças - respondeu Zazie. - As crianças que tiverem a minha idade daqui a dez anos, vinte anos, cinquenta anos, cem anos, mil anos, sempre vai ter crianças para serem aporrinhadas.
(...)
- Sabia - disse Gabriel, com calma -, segundo os jornais, não é de jeito nenhum nessa direção que caminha a educação moderna. É totalmente o contrário. Vamos na direção da suavidade, da compreensão, da gentileza. Não é isso, Marceline, o que dizem no jornal?
- É - respondeu Marceline, suavemente. - Mas violentaram você na escola, Zazie?
- Queria ver eles tentarem.
- Além disso - disse Gabriel -, daqui a vinte anos não vai mais ter professoras: vão ser trocadas pelo cinema, pela tevê, pelos eletrônicos, essas coisas. Também estava escrito no jornal, outro dia. Não é, Marceline?
- É - respondeu Marceline, suavemente.
Zazie vislumbrou aquele futuro por um instante.
- Então - declarou - vou ser astronauta.
- Isso aí - disse Gabriel, aprovando. - Isso aí, é preciso viver de acordo om os tempos.
- É - continuou Zazie -, vou ser astronauta para encher o saco dos marcianos".
(In. Zazie no metrô. Raymond Queneau. São Paulo: Cosacnaify, 2009, pp. 20-21).